É preciso aceitar, miga, a comunicação mudou e isso dói


A conversa entre as marcas Knorr e Hellmanns nos seus perfis brasileiros esta semana deu muito o que falar. Uma crítica acusa as empresas de imbecialização e utilização de humor raso, memes e modismo em busca de engajamento.

Antes de falar mais sobre o caso, quero dizer que nenhuma empresa do qual sou sócio é responsável por nenhuma destas ações. Dito isto, farei algumas reflexões importantes sobre como a comunicação vem mudando, como isso dói e, às vezes, não é aceito.

A interação entre marcas, que chamamos aqui na E.life de Social Mashup, ganhou notoriedade com a capacidade das redes sociais de se engajarem em conversações genuínas, entre pessoas ou com outras marcas. Perdeu espaço a comunicação descendente e unilateral. Redes sociais priorizam as conversações.

 

Social Mashup chama a atenção entre profissionais de social media e gera polêmica.

Em 1999, no livro Manifesto Cluetrain, Chistopher Lock já dizia: “A Internet está permitindo conversações entre seres humanos que simplesmente não eram possíveis na era da mídia de massa. As corporações não falam na mesma voz que as novas conversações em rede. Para suas pretensas audiências online, as empresas parecem ocas, lisas, literalmente inumanas. ”

A linguagem e o humor, ideais para a comunicação rápida do nosso tempo, também não é exclusividade das redes sociais (e muito menos das duas marcas). A propaganda já fazia isso há décadas, captando a voz das ruas e transformando bordões populares (alguns até bem rasos) em grandes cases de comunicação, não só no Brasil, mas no mundo.  Alguns destes bordões e campanhas (erroneamente chamados de memes) são hoje criticados por serem carregados de Machismo, Sexismo e outros ismos. Porém não se pode negar que são um retrato da sua época. A propaganda é uma excelente ferramenta de pesquisa histórica e antropológica de uma sociedade. Apesar de todos os carreteis de linha gastos na comunicação em 2015 ainda vemos propaganda de cerveja explorando o corpo da mulher na TV e assistimos boquiabertos ao boicote de marcas que colocam casais gays na tela. Nos dois casos, retratos da nossa sociedade e da nossa época.

A comunicação da Knorr e Hellmanns são muito mais uma antena da nossa época, captando as reais conversações dos consumidores, do que qualquer outra coisa. É difícil aceitar que uma marca desça do seu pedestal de marfim para se engajar neste tipo de conversação com o consumidor (ou pior, com outra marca). Mas isso também é um retrato dos nossos tempos.

O mais interessante é que nem são propaganda. As redes sociais são tão avessas a modelos que o seu post patrocinado (que sua agência fez) pode ter bem menos engajamento (e alcance) do que um post feito por um consumidor ou uma conversação entre marcas, como ocorreu neste caso.

Branding pra quê? Não podemos esquecer que a gestão de Branding deve focar muito mais em como uma marca é percebida do que como ela quer ser percebida. Há uma diferença muito grande aí. A percepção de uma marca é sim garantida pela sua história, pelos seus valores, mas esta mesma percepção muda em segundos. E pode ser aferida em segundos, graça ao monitoramento de redes sociais.

As pessoas não estão nas redes sociais para comprar nada. Elas estão lá para se divertirem. E a diversão faz parte do pacote de branding.

As marcas precisam é entender como fazer a gestão de branding, adaptando-se aos novos valores do consumidor, e a sua nova voz, na velocidade das redes. Todas estão tentando. E a Unilever não fica atrás. E isso não é ser esquizofrênico, é buscar aproximar-se do consumidor, mas na velocidade das redes. É tentar imitar a voz do consumidor com o objetivo de aproximar-se dele. Isso é sincero. Vale ressaltar que a Propaganda sempre fez isso, mas usando intuição, usando a voz das ruas e um pouco de sorte.

Nossa geração, porém, é diferente.Tem a sorte de usar dados, big data, para entender se a piada de fato teve ou não graça. E às vezes para o planejador, para o dono da agência, a piada mais sem graça é a que gerou mais engajamento. É a que fez os consumidores se reconhecerem nela. E no reconhecimento perceberem o quanto a marca está próxima. Branding!

E isso, miga, precisamos aceitar também, pois a comunicação data-driven é quem vai ditar o que é bom ou o que não é. Os dados não mentem.

A comunicação mudou e isso dói. É preciso aceitar que o consumidor é quem dita as regras e as marcas que não souberem se aproximar da voz do consumidor ou não tentarem se adaptar às novas agendas (por mais esquizofrênico que isso pareça) irão ficar para trás.

É um fim de uma era na propaganda: na mesma semana que Knorr e Hellmanns conversavam entre si numa linguagem humana, a Editora Abril se desfazia de vários dos seus títulos históricos. Pense nisso.

 

 Autor:

Alessandro Barbosa Lima, fundador do Grupo E.life.

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